sexta-feira, 4 de maio de 2012

História insignificante de uma vida significante


A vida das pessoas que não amamos, por mais insignificantes que elas possam nos parecer, tem o seu valor atribuído a quem os amam. Isso me faz lembrar da vez que passei a tarde inteira com a vovó me mostrando fotos de mil novecentos e bolinha. Do tempo que ela tinha um corpão, e aquele maiô de bolinhas estava na moda. To tempo das fotos em preto e branco, e daquelas caixinhas pequenas que tem uma lupa e uma foto ao fundo bem pequenininha, conhecidas por binóculos pelos mais velhos. Enfim, do tempo em que restam muitas histórias, e apenas poucos para conta-las.
- Essa daqui era minha irmã Isabel, que Deus a tenha. Pobresinha sofreu tanto. E esse aqui ao lado era o marido dela, ele morreu num acidente. Na época a Isabel estava grávida de dois meninos, a coitada ficou tão mal, que perdeu os bebês. Ela ficou deprimida, mas como naquele tempo essas coisas não existiam, ninguém entendia, e começaram a chamar de louca. Mas graças ao bom Deus, ela conseguiu casar de novo. O homem era trabalhador, carinhoso e a amava. O problema é que ele não podia ter filhos, mas Isabel já não ligava mais pra isso. Deixa eu ver, eu me casei em 48, então o segundo marido dela deve ter morrido em 47. Ele tinha um problema em não sei qual lugar da barriga, então ele foi operar, e não é que furaram o rim do homem? Pobre Isabel, nunca teve sorte na vida. Deis de pequena, sempre foi a mais esquálida, a mais magrinha, com uma cara sempre de quem tinha visto um fantasma. Parece que adivinhou que a vida não lhe reservara os melhores lugares para o espetáculo. Ela morreu um pouco antes de você nascer. Dizem que morreu daquela doença horrível, o câncer. Mas eu acredito que tenha morrido mesmo é de solidão
-Nossa!
Vovó me contou histórias como essa a tarde inteira. Ficou chorosa e nostálgica. E eu só fiz ouvir. E pensar. A vida de ninguém é insignificante, a vida só é resumida demais. Será mesmo que Isabel nunca fora feliz? E se ela fosse muito mais feliz sozinha? E se ela nunca tivesse desejado ser mãe? E se ela gostasse de ter aquela cara esquálida? Uma mesma história pode ser contada por vários ângulos. E a única história que pode ser considerada verídica por seu único ângulo, é aquela que você pode sentir com a pontas dos dedos, aquela que você vai saber o começo e o fim minunciosamente. A sua. Só essa vai ter sua significância e seu significado. O jeito como todos os outros a interpretam, não vai passar de uma histórinha contada de boca em boca, em tardes de sol.

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