domingo, 20 de novembro de 2011

A vida não é justa

O céu estava cinza e ventava. Ainda não eram nem 7 horas da manhã de um domingo frio, e lá estava eu, descendo as escadas com um saquinho de super mercado na mão. Sozinha. Tudo vazio. Só os prédios, as árvores, a grama, as escadas e a terra. A terra. Era exatamente isso em que eu estava a procura. Desço até uma parte mais reservada, e procuro um lugar que seja fácil de cavar. Olho para trás pra ver se não havia sido seguida, mas não, atrás de mim só havia o mundo acordando lentamente. Agacho, tiro a colher de alumínio da sacolinha, e começo a cavar. Uma terra avermelhada, com um cheiro que misturava mato e maconha. Cavo, cavo, cavo, até começar a ver algumas formigas. Paro. Chegou a hora. Na cabeça apenas um pensamento: "A vida não é justa". Tiro da sacolinha algo embrulhado em uma blusa minha que é linda, mas eu sempre achei que fica feia em mim, e que por algum motivo, no dia anterior eu decidi usar pela primeira vez. Aperto contra o peito e me despeço daquilo que estava embrulhado. Coloco no pequeno buraco que eu fiz, e começo a jogar terra em cima. Eu não podia simplesmente deixar ali, como se houvesse nada em baixo. Então pego dois pedacinhos de grama, e com isso faço uma cruz. Dor, agonia e lágrimas que teimavam em querer brotar no meu olho. Me levanto, e saio correndo sem olhar pra trás, sabendo que ali debaixo daquela terra avermelhada, continha uma quantia imensa do meu mais puro amor.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Teresa

Batem na porta, mas ela ainda finge estar dormindo. O som saindo do seu fone de ouvido está no máximo. Abrem a janela, ela cobre a cabeça com o edredom. Se pudesse, não sairia dali nunca. A canção toca como martelo, pregando água em seus olhos. O travesseiro úmido e salgado. Salgado. Era tudo salgado, cada camada de seu corpo era coberto de sal. Menos... menos seu coração. Esse ainda continha uma pureza, ainda não infectada. Mesmo assim, ela se contorce medo, muito medo. As lâmpadas queimam e ela sente medo. Precisava de afego. Precisava de um sorriso. Precisava de um amigo. Então abre os olhos e espera o sol ir embora, para então ter a certeza de que ela estava sozinha, mas que não era a única. Ela olha para a rua e vê as pessoas voltando de seus trabalhos, apressadas para jantar, assistir a novela das 9 e descansar seus pés. E então compreende que todas aquelas pessoas também precisavam de afego, de um sorriso e principalmente um amigo. Mas o estranho era que eles não pareciam se importar, do jeito que ela se importava. Confusa, ela vai para cama e umedece e salga o travesseiro de novo.
Ahh se ela soubesse que 5 anos depois, se tornaria um deles, que andaria pelas ruas ao anoitecer com seus pés cansados, pensando no que fazer para a janta. Se ela soubesse que ainda estaria sozinha. Se ela soubesse que quando acordasse ainda cobriria sua cabeça com o edredom e que seu coração cobriria-se de sal. Se ela soubesse que quando se escondesse no armário, ninguém iria procura-la. Ahh se ela soubesse... Ela nunca mais teria parado de fingir que estava dormindo.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Personagem de História em Quadrinhos

Posso ou não, ter marcado em meu peito tua ausência presente?
01:10 marcava o relógio, e o último maço de cigarro ia embora. Fazem anos deis de sua partida, e eu ainda parada na janela lembrando dos dias de chuva em que você me fazia um nescau com leite. E agora só me resta ficar emaranhada num café amargo, cheio de mágoas cristalizadas. Não pergunto mais "Por quê?",  nem falo mais "E se...", não, agora é pior. Me contorço em duas e me faço pensar que você está aqui. Que toda minha perseguição, teve finalmente seu lucro no final. Que agora quem treme por medo de ficar só, é você. Que eu te abraço e te falo "Eu não vou sair daqui, enquanto você respirar". Mas a verdade, é que você não respira, nunca respirou. Que mesmo em tua presença, o meu amor sempre foi entregado à uma singela ilusão, à um personagem de histórias em quadrinhos dentro da minha cabeça. Um super-herói que eu pintei e despintei com meus próprios dedos. E que na hora em que eu estava prestes a desabar, só por descobrir que eu não podia te tocar, você segurava minhas lágrimas e soprava uma brisa suave no meu rosto. Tenho que confessar que ainda sinto essa brisa, sinto as lágrimas presas, sinto a chuva, sinto às cinzas do cigarro caindo, sinto meus dedos calejados de tanto te desenhar, sinto a mágoa, sinto o gosto amargo do café. Mas não sinto você. Não sinto porque você não está aqui. Você nunca esteve.